Barragem de urânio está no radar do Ministério Público Federal

18 out 2023
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 Os processos de adequação da barragem que retém rejeitos de urânio em Caldas, no Sul de Minas, vêm sendo acompanhados de perto pelos procuradores do Ministério Público Federal (MPF), sobretudo com o barramento tendo entrado em nível 1 de emergência (demanda obras urgentes), não ter obtido atestado de estabilidade de auditorias externas e independentes no início de outubro e não poder ser embargado, uma vez que não tem para onde transferir o material radioativo, como mostrou a edição de ontem do Estado de Minas. O MPF já vinha fazendo recomendações para que a empresa que opera o empreendimento, a Indústrias Nucleares do Brasil S.A. (INB), compusesse um plano de emergência desde 2019 – época do rompimento de Brumadinho – devido a várias anomalias detectadas na estrutura.
A barragem contém 2,5 milhões de m³ de rejeitos de urânio 0,70%, material radioativo nocivo ao meio ambiente e ao homem, resultado da extração do elemento para beneficiamento em combustível nuclear, de 1980 a 1995. O MPF indicou, há 4 anos, que "o sistema de escoamento da barragem está comprometido" e que "infiltrações encontradas favorecem a ocorrência de processo de erosão interna e aumentam a probabilidade de ruptura".
Neste ano, vistoria da Agência Nacional de Mineração (ANM)  concluiu que no barramento há indicativo de percolação (infiltração), com umidade ou surgência nas áreas de jusante (parte externa da barragem no sentido do fluxo do manancial que a formou). Também foram identificadas falhas na proteção dos taludes, com presença de vegetação arbustiva. A vistoria foi feita depois de a ANM assumir a fiscalização da Barragem BAR, transferida pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) ao órgão.
No relatório, a ANM considera que o impacto ambiental em caso de rompimento seria "muito significativo agravado", pois a barragem "armazena rejeitos ou resíduos sólidos classificados na Classe I – perigosos, segundo a NBR 10004/2004". Já o impacto socioeconômico poderá ser "baixo", por existir "pequena concentração de instalações residenciais, agrícolas, industriais ou de infraestrutura de relevância socioeconômico-cultural na área afetada a jusante da barragem".
"O MPF, por meio do Núcleo Ambiental da PRMG, está acompanhando atentamente as barragens de Caldas, pertencentes à INB. Ademais, o MPF conta com procedimentos anteriormente instaurados para apurar e acompanhar as condições de segurança e estabilidade das estruturas da INB. Por fim, reitera-se que o MPF e ANM estão atentos a essas barragens, com a expedição de recomendações técnicas e acompanhamento rigoroso das condições de seguranças e estabilidade, com o objetivo de diminuir o nível de emergência e minorar os riscos de situações indesejáveis", informou o Ministério Público.
De acordo com a ANM, as duas barragens da empresa que não tiveram a estabilidade atestada – a BAR e uma outra, mas sem material radioativo – não puderam ser embargadas por questões ambientais, "visto que, de acordo com manifestação formal da Comissão Nacional de Energia Nuclear (antigo órgão competente pela fiscalização de barragens de rejeitos nucleares), a menos que os efluentes tratados possam ser direcionados para outro destino apropriado e licenciado, o embargo das barragens poderá levar a um possível impacto radiológico ambiental. Essas estruturas são de responsabilidade das Indústrias Nucleares Brasileiras e eram antes fiscalizadas pelo CNEN, passando a ser de nova competência transferida para a ANM".

PLANO DE CONTINGÊNCIA
Em Caldas, cidade que pode ser atingida em caso de rompimento, que afetaria até 500 pessoas, segundo a ANM, um plano de contingência já foi formulado e está pronto para ser implementado em caso de emergência, segundo a Defesa Civil do município. Se as intervenções que vêm sendo feitas pela INB para conferir mais estabilidade para a barragem não forem suficientes e a barragem piorar e entrar em nível 2 (anomalias não controladas na estrutura), a INB deverá imediatamente mobilizar as pessoas e autoridades por comunicações (ligação, mensagem, WhatsApp) com fluxo de notificação interna e externa; verificar a possibilidade de ir até o local da surgência para avaliar a gravidade da situação e se é viável o rebaixamento do reservatório (instalar bombas para auxiliar o esvaziamento do reservatório); e, em último caso, verificar a possibilidade de escavação de outro vertedor na ombreira, para esvaziar mais rapidamente o reservatório. De acordo com o plano, as pessoas da Zona de Autossalvamento (ZAS) devem ser evacuadas.
Caso o dano na barragem BAR, que reserva rejeitos de urânio em Caldas, no Sul de Minas, chegue ao seu estado mais crítico e a estrutura atinja o nível 3 de emergência (rompimento iminente ou em curso), as medidas de socorro e mitigação previstas pelo plano de contingência serão ainda mais drásticas, com a operadora da planta, a INB ficando responsável pelo acionamento do carro de som. As rádios serão usadas para veicular a informação, em caráter de emergência, informando sobre os locais de abrigo e rotas de fuga.
Em paralelo, as autoridades municipais deverão instalar um posto de comando e buscar restabelecer serviços essenciais (energia elétrica, água e telefonia). Será providenciada a triagem das pessoas afetadas pelo desastre e seu encaminhamento para abrigos, residências de parentes ou amigos – fora da área de risco – pelos ônibus municipais. Técnicos de emergência do CNEN e CDTN serão acionados para avaliar os riscos radiológicos. Se houver necessidade de assistência médica, os afetados (feridos) serão transferidos para a cidade vizinha de Poços de Caldas, conforme o grau da lesão das vítimas. Vistorias serão feitas nas áreas afetadas e será decretada Situação de Emergência ou Estado de Calamidade Pública, se for o caso. Em seguida, serão realizados os trabalhos de desobstrução e recuperação de vias e obras de arte especiais (pontes, passarelas, etc). Recepção, triagem e distribuição de ajuda humanitária aos afetados.
“SEM PIORA”
A INB informa que “o enquadramento das estruturas não é resultado de piora nas construções, apesar de várias observações feitas pela fiscalização que precisam ser readequadas”.  Segundo a empresa, "com a promulgação da Lei 14.514 de dezembro de 2022, a ANM passou a regular e fiscalizar as estruturas de mineração das unidades da INB. Tanto a barragem de rejeitos quanto a D4 foram incluídas pela INB, em junho de 2023, no SIGBM e ficaram enquadradas no nível 1 de emergência", destaca, em nota.
Ainda de acordo com o texto, “como esperado, pelo fato de as duas barragens se encontrarem no nível de emergência 1, o auditor independente não atestou a estabilidade das estruturas e indicou que elas devem passar por obras de adequação". A empresa frisa ainda que "não ocorreu fato novo relacionado à estrutura das barragens, que permanecem no nível 1 de emergência, de acordo com os critérios estabelecidos. O nível 1 de emergência é o primeiro na escala de 3 níveis, o que representa que não há risco de ruptura iminente. A INB ressalta que está trabalhando para promover as adequações necessárias para sair do nível de emergência e receber o atestado de estabilidade".
MG CONCENTRA RISCO
A chegada da estação das chuvas, que vai até março, traz preocupação extra para Minas Gerais, já que o estado concentra os riscos nas barragens de rejeitos da mineração. São 57 (62%) das 92 estruturas brasileiras em nível de emergência monitoradas pela Agência Nacional de Mineração (ANM), segundo dados deste mês. O estado tem, ainda, 287 barragens que operam sem qualquer estado crítico, sendo que no Brasil esse número é de 836.
Das 30 estruturas brasileiras com a classificação de "nível de alerta" – quando há alguma "anomalia (na barragem) que não implique risco imediato à segurança, mas que deve ser controlada e monitorada" –, 21 (70%) estão em Minas Gerais. Se encontram em Nível 1 outros 54 barramentos brasileiros, dos quais 28 (52%) em Minas. Esse estágio é alcançado em situações como a não entrega da Declaração de Condição de Estabilidade (DCE), DCE de instabilidade e situações de comprometimento potencial da estrutura que demandem obras de reforço.
Todas as cinco barragens em Nível 2 (contêm anomalias não controladas) e as três em Nível 3 (ruptura inevitável ou ocorrendo) também estão em Minas Gerais. Das 456 barragens de mineração brasileiras atualmente inseridas na Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB), 420 possuem DCE atestando a estabilidade, 27 entregaram declaração não atestando a estabilidade das estruturas e seis não enviaram as DCEs. "O não envio da DCE, quando obrigatório, pressupõe a estabilidade não atestada da estrutura, resultando em 31 barragens de mineração embargadas por não envio da DCE ou envio não atestando a estabilidade. Minas Gerais abrange 25 (81%) barragens de mineração do total de 31 embargadas pela não declaração de estabilidade", informou a ANM.
Outro documento importante e obrigatório para atestar a segurança de barragens e empreendimentos com essas estruturas são as Declarações de Conformidade e Operacionalidade (DCO) do Plano de Ação de Emergência para Barragens de Mineração (PAEBM). Essa avaliação feita por empresa independente atesta que o PAEBM está em conformidade com a legislação vigente e operacional em sua aplicabilidade em situações de emergência, como galgamentos (quando a água contida na barragem ultrapassa a crista da estrutura) e até rompimentos.
Das 311 entregas em conformidade de DCO no Brasil, 152 (49%) vieram de empreendimentos em Minas Gerais. No Brasil, sete empresas não entregaram, sendo duas mineiras. E das 27 que não conseguiram aprovar a conformidade e a operacionalidade, 24 (89%) estão em território de Minas. 
SITUAÇÃO DAS BARRAGENS
Confira o estado dos barramentos da mineração em MG e no Brasil
Condição MG BR
Sem emergência 287 836
Nível de alerta 21 30
Nível 1 28 54
Nível 2 5 5
Nível 3 3 3
Declaração de Condição de Estabilidade
Condição MG BR
Atestada 175 419
Não atestada 24 27
Não enviada 3 6
Declarações de Conformidade e Operacionalidade
Condição MG BR
Atestada 152 311
Não atestada 19 22
Não enviada 2 7
Fonte: ANM

FONTE: Estado de Minas

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