Em Marselha, papa pede socorro a migrantes no mar, ‘um dever da humanidade’
O papa Francisco pediu, nesta sexta-feira (22), em Marselha (sudeste da França), para "socorrer" os migrantes que arriscam a vida no mar, palavras esperadas pelas associações que os ajudam, em pleno debate na Europa sobre a acolhida aos refugiados.
"As pessoas que, ao serem abandonadas sobre as ondas, correm o risco de se afogar, devem ser socorridas. É um dever da humanidade, é um dever de civilização", disse o pontífice, junto a um memorial dedicado aos desaparecidos no mar.
Aos pés da basílica neobizantina de Nossa Senhora da Guarda, coroada por uma estátua imponente da Virgem Maria com o menino Jesus nos braços, Francisco depositou flores brancas e amarelas em homenagem aos desaparecidos no mar.
"São nomes e sobrenomes, são rostos e histórias, são vidas rompidas e sonhos destroçados (...) Frente a semelhante drama, as palavras não servem, senão os fatos", disse pouco antes diante de líderes religiosos e membros de associações de ajuda aos migrantes.
Ele agradeceu a estes coletivos por seu importante trabalho, embora algumas vezes sejam impedidos, pelos governos europeus, de zarpar para realizar os resgates. "São gestos de ódio", pontuou o pontífice.
"É muito forte o reconhecimento de nosso trabalho e esperamos que [sua fala] tenham impacto e dê um fim à criminalização de nosso trabalho", disse à AFP Fabienne Lassalle, chefe da ONG SOS Méditerrannée.
A cerimônia era o momento mais esperado e simbólico de sua visita. Júnior, um jovem migrante da Costa do Marfim, leu uma passagem sobre o naufrágio do apóstolo São Paulo em Malta.
Já Ainhoa e Angy, duas meninas de oito e 10 anos que moram na França, entregaram duas cartas ao papa, que lhes deu duas rosas.
"Pedi a ele na carta que reze pelas crianças pobres em todo o mundo e que são órfãs", disse Ainhoa, contando que estava "muito emocionada" por falar com o pontífice.
- "Crueldade" -
Da Venezuela à América Central e ao México, passando por Estados Unidos, África e Oriente Médio, os migrantes são uma prioridade para Francisco, que costuma expressar a dor pelas tragédias que eles sofrem.
Sua visita ocorre dias depois de milhares de migrantes chegarem à ilha de Lampedusa, o que obrigou a União Europeia (UE) a adotar um plano para ajudar a Itália a gerenciar esta rota migratória saindo do norte da África.
Perguntado a respeito no avião papal, Francisco, cuja primeira viagem como pontífice, em 2013, foi a Lampedusa, e também visitou centros de migrantes na Grécia, lamentou a "crueldade" e a "falta de humanidade" que se vive no Mediterrâneo.
Mais de 28.000 migrantes desapareceram em suas águas desde 2014 tentando chegar à Europa, saindo da África, segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM).
Boubacar (pseudônimo), que chegou a Marselha há 10 dias, recorda as dificuldades que enfrentou antes de desembarcar em Lampedusa: "Passamos 24 horas no mar sem comer, sem beber, sem fazer as nossas necessidades".
- "Fanatismo da indiferença" -
Embora com a saúde debilitada, o papa, de 86 anos, que se desloca em cadeira de rodas, fez sua quinta viagem do ano para fora da Itália e do Vaticano, após visitar a República Democrática do Congo, o Sudão do Sul, a Hungria, Portugal e Mongólia.
Em uma Europa onde a acolhida divide opiniões, a extrema direita e a direita conservadora, que alertam para uma suposta "invasão" migratória, criticam que o papa fale tanto sobre os migrantes.
Embora durante seu voo a Marselha tenha admitido não saber se teria "coragem" de dizer tudo o que queria, ele criticou os "contrabandos repugnantes" e "o fanatismo da indiferença" e pediu para "superar a paralisia do medo" para "cuidar dos mais fracos".
Sua 44ª viagem internacional e a primeira desde 1533 de um papa a Marselha desperta grande interesse, mesmo com o declínio do catolicismo na França, um país laico desde 1905 no qual as acusações de abuso sexual dentro da Igreja aceleraram a crise.
Mas Francisco já advertiu que sua viagem à segunda maior cidade da França não é uma visita oficial ao país. Sua finalidade é encerrar um encontro entre bispos e jovens do Mediterrâneo, que tem como principais temas as desigualdades, o diálogo inter-religioso e a mudança climática.
Milhares de fiéis são esperados nas ruas desta cidade cosmopolita - onde vivem as mais diversas comunidades e religiões - especialmente no sábado, dia que acontecerá uma missa para quase 60 mil pessoas no estádio Velódromo.
Primeiro, o papa Francisco percorrerá a grande avenida do Prado em seu "papamóvel", para que possa ser cumprimentado pela multidão. Depois, ele irá para a cerimônia no estádio, que contará com a presença do presidente francês, Emmanuel Macron, cuja presença foi criticada.
FONTE: Estado de Minas