A árvore mais antiga de BH e os patrimônios verdes da cidade
15 set 2023
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Antes de ser Belo Horizonte, a capital mineira era um arraial com cerca de 370 casas, um chafariz, a sede de uma fazenda e também jaqueiras, copaíbas, gameleiras, casuarinas, amoreiras, jatobás, saponeiras, jabuticabeiras e muitos ipês. Essas eram as árvores que estavam aqui antes de o lugarejo ser demolido para dar lugar à cidade planejada. No quesito arborização, o trabalho foi entregue aos cuidados do renomado “arquiteto-jardineiro”, como era chamada Paul Villon, o francês incumbido do paisagismo dos parques e das ruas da futura capital.
Desses tempos não tão remotos, em que não ficou de pé quase nenhuma edificação do arraial original, restaram árvores, que garantiram ao município o título de cidade-jardim. Algumas dessas árvores, cuja história e beleza fizeram parte da memória da cidade, pela beleza, raridade ou longevidade, chegaram a ser tombadas como patrimônio público ou protegidas por um decreto municipal da década de 1930, o que não impediu que desaparecessem do mapa, por ação do tempo ou do homem.
Em 1990, uma nova ação, desta vez do Conselho Deliberativo do Patrimônio Histórico, incluiu nove espécies ou conjunto delas no Livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico de Belo Horizonte. Dessas, restam apenas o jambo rosa da Rua Espírito Santo, no hipercentro da cidade, as sapucaias da Avenida Gustavo Silveira, no Bairro Santa Inês, o conjunto de fícus da Avenida Bernardo Monteiro, no São Lucas - atacado por pragas em 2013, mas que, aos trancos e barrancos e com muitas supressões - sobreviveu; e as espécies de pau-ferro, na Avenida Barbacena, no Santo Agostinho.
Mobilização em defesa do patrimônio
Do jequitibá da Avenida Guaicuí, no Bairro Luxemburgo, que mobilizou a cidade e a Câmara Municipal de Belo Horizonte em sua defesa, não resta nem a memória de sua existência. As casas no lugar foram transformadas em comércio ou viraram apartamentos e ninguém nem lembra mais que um dia aquela avenida abrigou um patrimônio histórico, um jequitibá que quando foi tombado, em 1990, tinha cerca de 60 anos. Mesmo caso do centenário ipê-branco, também tombado, que ficava na Afonso Pena, outrora um local repleto de ipês.
No local, foi plantada uma nogueira, mas ao longo da avenida existem outros ipês-brancos, ainda pequenos, mas já chamando a atenção pela floração, curta, mas muito bonita.
A paineira da Rua Bernardo Guimarães com Mato Grosso, no Santo Agostinho, morreu e outra foi plantada no lugar. A nova já está bem alta, espécie é de crescimento rápido, e continua recebendo atenção e cuidado dos moradores principalmente do edifício Paineiras, bem ao lado do local onde um dia existiu uma árvore tombada.
"Adoeceu e não resistiu"
O pau-brasil, árvore símbolo do país, que fica na no hall das bandeiras da Assembleia, não resistiu às intempéries do tempo, mas outro foi plantado no mesmo local, em 2014. Quem cuida dele é o jardineiro Valdeci Domingos Alves, de 53 anos, um dos responsáveis pelos jardins do Legislativo há quase duas décadas. Segundo ele, a árvore “adoeceu e não resistiu”. “Mas era bonita, com aquele tronco meio avermelhado”, lembra.
Outra espécie tombada que não existe mais, e que era muito comum no arraial Del Rey, é uma copaíba que ficava no meio dos asfalto da Rua Itaguaí, no Caiçara. Segundo a empresária Leia Pereira Passos, que nasceu no bairro, a copaíba ou pau-de-óleo, árvore frondosa e de tronco avermelhado, ficava ao lado da porteira que dava acesso a uma fazenda, posteriormente loteada para virar o bairro vizinho Engenho Nogueira.
A mãe de Leia, Irene de Campos Pereira, que também viveu na região toda vida, falecida em 2020, aos 88 anos, era quem cuidava dessa copaíba com o “maior amor”. “Ela falava que a árvore era dela. Foi ela quem cercou e tomou conta dela a vida inteira, desde quando ela ficava na entrada dessa fazenda, que já não existe mais”, conta Leia. A árvore chegou a ser alvo de campanhas para cortá-la, pois vira e mexe acontecia alguma colisão. No lugar, foi plantado um ipê-amarelo, que já está florindo.
As 10 árvores mais comuns de BH:
SibipirunaMurtaLicuri Quaresmeira (árvore símbolo da cidade)Palmeira arecaIpê-rosaAlfeneiroResedáPata-de-vacaIpê-tabaco
Um jambo de sorte
Uma das sobreviventes, o jambo-rosa da Rua Espírito Santo, típica do Norte e Nordeste do país, incomum na arborização urbana, nasceu por sorte, que a acompanha até hoje. Quando a capital foi sendo moldada ao longo dos anos, o projeto paisagístico previa o plantio em série nessa rua de magnólias, de cheirosas flores amarelas, cujas mudas se parecem com o jambo. Uma confusão entre as espécies teria dado origem ao jambo, que tem cerca de 70 anos.
Quem também resistiu bravamente é o conjunto de sapucaias que fica na entrada do Horto Municipal. São 10 exemplares em um largo que leva o nome delas na Avenida Gustavo da Silveira, no Santa Inês. Árvore genuinamente brasileira, ela produz um coco duro e pesado, cujas castanhas são nutritivas e deliciosas. Nessa época do ano, as folhas ficam completamente rosas, parando o trânsito na avenida.
Vizinha do Largo das Sapucaias, dona Guilhermina Santos Moreira, de 68 anos, disse que as árvores estão lá há pelo menos meio século. “Quando me mudei para aqui, há 55 anos, elas já estava aqui”, conta a aposentada, feliz em saber que seria feita uma reportagem sobre elas. “Até que enfim. Ninguém lembra delas, só dos ipês, e elas são uma beleza com suas quatro cores, verde-escuro, verde-claro, roxeada e rosa”, lista a moradora, que guarda como uma preciosidade uma sacola plástica lotada de castanhas.
Sua irmã, Celeste Pereira dos Santos, de 64 anos, conta que quando as folhas ficam rosa o povo para o carro para ver. “Muita gente não conhece a sapucaia, apesar de ter muita dela em Belo Horizonte”.
A árvore mais antiga de BH
Uma das árvores mais antigas da cidade, conta Júlio De Marco, arquiteto urbanista da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, está intimamente ligada à história de Belo Horizonte. É um ficus elástica, na sede do Museu Abílio Barreto, onde também está localizada a única construção remanescente do Arraial do Curral Del Rey, a sede da outrora Fazenda Leitão. Gigante, a árvore chama a atenção pela sua imponência e tamanho da copa.
Primeira árvore a ser plantada oficialmente
Em 5 de maio de 1898, foi iniciada oficialmente a arborização da cidade, sob orientação do engenheiro Bernardo Figueiredo, da Comissão Construtora da capital. De acordo com os registros do livro “Notas cronológicas de Belo Horizonte”, a primeira espécie foi a maçã-de-elefante, plantada na Rua Guajaras, mas hoje muito comum ao longo da Rua dos Timbiras, entre as avenidas Álvares Cabral e Afonso Pena. Na época foram autorizados o plantio de 1,5 mil mudas.
Árvore batizada com o nome da cidade
Em 1914, o engenheiro e curioso por botânica, Álvaro Astolpho da Silveira, publicou o livro “Arborização de Bello Horizonte”, onde ela contava a história do plantio de árvores da cidade e afirmava ter encontrado um exemplar ainda não identificado que ele batizou de Aspidosperma bello horizontinunn, representada, segundo ele, por um único exemplar, existente na Rua Bernardo Guimarães e ainda não classificado cientificamente.
A informação de que essa árvore, da família da peroba, não tinha sido classificada não procedia, com isso a cidade perdeu a oportunidade de ter de fato e de direito uma árvore batizada em sua homenagem.
Máquina de transplantar
A arborização da cidade ficou a cargo do renomado “arquiteto jardineiro”, Paul Villon, responsável por muitos dos belos jardins parienses. Com dó de cortar as espécies que já existiam no arraial que deu origem à cidade, mas que teriam que ser cortados para dar origem à cidade planejada, ele pediu à comissão construtora que comprasse uma máquina para transplantar essas árvores para o já criado Parque Municipal, inaugurado antes mesmo da cidade. Em 27 de maio de 1986, foi inaugurado essa máquina, trazida de Paris e que custou aos cofres do estado 4 mil francos.
As árvores mais comuns em BH
Belo Horizonte tem hoje cerca de 650 mil indivíduos arbóreos (árvores, arbustos e palmeiras), nome técnico para o que a população convencionou chamar popularmente de árvore, divididos em aproximadamente 530 espécies. Os dados são estimados a partir do levantamento feito para o inventário das árvores, realizado pela PBH entre 2011 e 2014.
A árvore mais comum na cidade é a sibipiruna, que nesta época do ano está com a copa coalhada de pequenas flores amarelas. Ela representa 6,3% de todas as árvores da capital, seguida de perto pela murta (6,1%), que também já começou a florir e é muito confundida com a dama-da-noite, devido às flores brancas e bastante cheirosas.
Na sequência vêm a palmeira licuri (4,5%), a quaresmeira (3,5%), árvores símbolo da capital, a palmeira areca (3,3%), o ipê-rosa (3,2%), o alfeneiro (2,2%), a resedá (2,1%), a pata-de-vaca (2,09%) e o ipê-tabaco (2,01%). O restante é dividido em árvores variadas, que totalizam cerca de 500 espécies, segundo a Secretaria Municipal de Meio Ambiente.
As árvores de maior porte de BH
Guapuruvu - Parque MunicipalPau-rei - Praça Rodrigo Emile Campos, no bairro SerranoPau-mulato - Rua Araguari com Bernardo Guimarães, no Santo AntônioJequitibá - Alameda Ezequiel DiasFicus elástica - Rua Cobre, no Cruzeiro
De acordo com o arquiteto urbanista, Júlio De Marco, da Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Belo Horizonte, que, além de ser um dos responsáveis pela arborização do município, é também um “apaixonado pelas árvores”, a cidade é uma capitais das mais arborizadas do Brasil e do mundo, em relação a quantidade de árvores em seu território.
Poderia até ser mais, conta ele, se não fosse o vandalismo da população, que danifica as árvores e também as estruturas feitas para proteção, instaladas enquanto elas se firmam. Das 54 mil mudas plantadas durante a Copa do Mundo no Brasil, em 2014, 15% já foram depredadas.
Sabia Não, Uai!
O Sabia Não, Uai! mostra de um jeito descontraído histórias e curiosidades relacionadas à cultura mineira. A produção conta com o apoio do vasto material disponível no arquivo de imagens do Estado de Minas, formado também por edições antigas do Diário da Tarde e da revista O Cruzeiro.