Abandono do Abrigo Granja de Freitas revela caos e desprezo da PBH
Uma visita da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assistência Social sobre as Pessoas em Situação de Rua ao Abrigo Granja de Freitas, mantido pela prefeitura de Belo Horizonte, com administração da Cáritas Brasileira, revelou uma situação caótica e de total abandono por parte das autoridades municipais. O que deveria ser um local de acolhimento e resgate para pessoas em situação de vulnerabilidade tornou-se um ambiente de precariedade, conforme constatado in loco pelos membros da CPI.
O Abrigo Granja de Freitas tem destinação ao acolhimento para famílias em situação de vidas nas ruas e famílias vindas de locais de situação de risco geológico encaminhadas pela Companhia Urbanizadora e de Habitação de Belo Horizonte - URBEL, a fim de garantir proteção socioassistencial. O local possuiu 108 unidades, porém hoje atende apenas 44 famílias.
O cenário encontrado pela comitiva foi desolador. Entre as irregularidades, destacam-se cheiro forte de esgoto, sujeira generalizada, mato alto em praticamente todas as partes do abrigo e a completa ausência de manutenção. O abandono é tamanho que compromete a dignidade das famílias que moram no abrigo colocando em xeque a eficácia das políticas públicas de assistência social implementadas pela prefeitura.
Dona Lena mora no Abrigo Granja de Freitas há 11 anos. Foi para lá devido sua casa estar em área de risco e ter sido condenada pela Urbel. “Isso aqui é um absurdo total. Virou depósito de gente, pois estamos aqui esquecidos. Fomos tirados de nossas casas e estamos aqui ocupando vagas de outras pessoas. Por aqui não vemos progresso algum e só piora”, afirma.
Quem também mora no Abrigo Granja de Freitas é Melissa. No local há 6 anos, ela conta sobre o desconforto em morar em um ambiente sujo. “Aqui é muito complicado, pois convivemos diariamente com animais peçonhentos como cobras, escorpiões, ratos e baratas. A manutenção é precária e nossa situação é grave porque aqui é um ambiente propício para o aparecimento deles. A nossa saúde e dos nossos filhos está em risco”, lembra.
Daniela também mora no Abrigo Granja de Freitas há 6 anos. Ela afirmou à CPI que no período em que está lá nunca viu limpeza da caixa d'água do local. “Meu filho tem problemas intestinais várias vezes ao ano. Nada me tira da cabeça que é a impureza dessa água aqui do abrigo”.
Rogério está morando no local há quase dois anos. Ele tem o benefício do aluguel social, no valor de R$500,00, contudo não consegue encontrar imóveis em Belo Horizonte que estejam sendo alugados por este valor. “O valor é muito baixo. Muito difícil achar imóveis neste valor e quando damos a sorte de encontrar geralmente a URBEL durante a vistoria dá bomba no imóvel. Eles são bastante rigorosos e até um vidro quebrado é motivo de indeferimento. Mas o contrassenso nisso tudo é que lá na hora da vistoria eles são rigorosos, mas ao mesmo tempo tem a coragem de nos deixar aqui abandonados nesses cubículos que quando faz calor parece uma panela de pressão devido as telhas de amianto e quanto chove nos molhamos todos aqui dentro. Uma completa falta de respeito e de humanidade”.
IMPRESSÕES
O vereador Braulio Lara (Novo), presidente da CPI, ficou impressionado com o que viu. “É estarrecedor tudo que vimos aqui hoje. Constatamos a total falta de comprometimento da prefeitura em oferecer condições mínimas de moradia para aqueles que mais necessitam. A unidade deveria ser um refúgio seguro para pessoas retiradas de áreas de risco ou com trajetória de vida nas ruas, mas, lamentavelmente, tornou-se um símbolo de descaso”.
O parlamentar continua. “É a partir deste exemplo que temos ouvido relatos de pessoas que não querem ir para os abrigos ou albergues. A CPI tem percebido que existem as vagas, mas por quê as pessoas não querem utilizá-las? Talvez hoje, nesta visita ao Abrigo Granja de Freitas, tenhamos encontrado a resposta. Não faz sentido ter vagas nos abrigos e ver tantas pessoas nas ruas. Algo está errado”, afirma Braulio Lara.
Cleiton Xavier, relator da CPI, também participou da visita e afirma que o cenário que viu foi vergonhoso e estarrecedor. “Os moradores têm que aceitar as imposições da URBEL e não podem fazer pequenas reformas em seus abrigos e melhorar o ambiente onde vivem. São obrigados a viverem sob condições de extremo calor ou com goteiras de chuva. O abrigo não conta com mangueiras nos hidrantes ou extintores em caso de incêndio”.
O relator finaliza. “Ver de perto a ineficiência do poder público escancarado desta forma é inadmissível. A população não pode aceitar passivamente essa realidade, pois está em jogo não apenas o abandono de um local, mas a negligência para com vidas humanas. O dinheiro público que deveria ser destinado a garantir o bem-estar dos cidadãos mais vulneráveis está sendo mal empregado. Além disso, a integridade física e psicológica daqueles que buscam alento no Abrigo Granja de Freitas está sendo comprometida. Cabe agora a nós vereadores e também à sociedade exigir responsabilidades e cobrar ações imediatas por parte da administração municipal para reverter esse cenário de desumanidade”.