Calote de escola do Barreiro era questão de tempo, segundo pais de alunos
"Era uma bola de neve. A gente sabia que ia dar nisso (fechamento da escola). Cada hora a gente pagava a mensalidade para uma empresa de CNPJ diferente. Comprava livros, pagava para o dono e simplesmente não recebia o material. Lá já foi muito bom, mas o dono largou a escola quando viu que não tinha mais jeito. Os professores eram ótimos, nada a reclamar deles. São vítimas como nós", o desabafo é do pai de um aluno que só se identifica como Rafael, já bastante fragilizado pelas tentativas de transferir o filho de 10 anos do Colégio Sant'Anna, no Barreiro, depois que a instituição simplesmente fechou e o diretor, de 54 anos, que é também o proprietário, desapareceu.
Revoltados com a situação, 22 pais e funcionários fizeram uma ocorrência na Polícia Militar depois que encontraram os portões do Colégio Sant'Ana fechados, na sexta-feira (15/09). Apenas uma secretária e a filha do dono, que é professora do jardim de infância, estavam lá. Há cerca de um mês o diretor não aparece e sequer estaria atendendo os telefonemas da própria filha, de acordo com o que ela disse à PMMG.
Segundo informações do Sindicato dos Professores de Minas Gerais (Sinpro-MG), o colégio vinha atrasando os salários dos profissionais, que ganhavam perto do salário mínimo da categoria. Metade era paga por mês e no mês seguinte o restante era quitado, quando os profissionais já deveriam receber pelo novo mês trabalhado.
"A escola era muito querida, muito tradicional na comunidade e os professores acabaram acreditando no patrão, como forma de solidariedade. Só que, com isso, não nos avisaram que a situação estava tão grave. Por isso, não pudemos fazer nada antes. Agora, vamos atender e representar cada um deles, a partir dessa segunda-feira (18/09)", afirma a presidente do Sinpro, Valéria Morato.
Um dos cadastros nacionais de pessoa jurídica é de 23 de janeiro de 2023 e só durou sete meses até ser fechado, em 23 de agosto deste ano, constando um capital social de R$ 5 milhões. A atividade econômica principal era a educação profissional de nível técnico, infantil, pré-escola, ensino fundamental e médio. A extinção ocorreu por decisão líquida e voluntária da sociedade empresarial com apenas um sócio-administrador, o próprio diretor da escola.
Mas, entre as relações de CNPJs utilizados de acordo com a documentação mostrada pelos pais, há também indicação de empresas coim atividades não diretamente relacionadas com a educação, como um Instituto e Clinica Especializada que leva como nome de fantasia Colégio Santana (e não Colégio Sant'Anna), aberta em 2021 e de capital social de R$ 20 mil. Essa firma tem como atividade os atendimentos "médica ambulatorial restrita a consultas". No quadro societário consta apenas uma mulher de mesmo sobrenome do diretor e proprietário do colégio.
A terceira empresa com cadastro nacional de pessoa jurídica apresentada tem o nome de outra mulher com o mesmo sobrenome do diretor e proprietário, tendo como atividade principal a educação infantil e pré-escola. O capital social da empresa é de R$ 10 mil.
Caso será investigado
Na segunda-feira, o Sinpro-MG informou que irá atender aos 10 professores que ficaram sem salários e direitos depois que a institutição fechou e o proprietário desapareceu. As mensalidades cobradas na instituição variavam, chegando a R$ 790 para a educação infantil, mas ao todo cerca de 300 famílias de alunos podem ter sido lesadas, segundo estimativa da entidade de classe.
O caso será investigado pela 2ª Delegacia de Polícia Civil do Barreiro. A reportagem não conseguiu contato com o diretor ou integrantes da administração da escola.
Na sexta-feira, dia do fechamento, a PMMG encontrou na instituição fechada apenas uma secretária, de 41 anos, que disse que poderia repassar aos pais as declarações de escolaridade, mas que para expedir o histórico escolar, necessitaria da assinatura do diretor.
Uma das filhas do diretor e proprietário informou para os policiais que trabalhava como monitora do berçário e que não tinha qualquer relação com as atividades administrativas e financeiras da escola. Ela mesma diz não ter tido contato com o pai há mais de um mês e desconhecer o seu paradeiro.
A instituição é tradicional no Barreiro e por isso mesmo muitas pessoas da região reagiram com espanto ao ver a concentração de viaturas da polícia e o protesto de pais e professores na porta da escola.
Uma das propagandas que reforçava o compromisso pedagógico da instituição era a propaganda do uso de material e método do Colégio Bernoulli, uma das instituições de ensino mais renomadas da capital mineira. Contudo, consta inclusive litígio de representantes do Bernoulli contra o Colégio Sant'Anna por não cumprimento de obrigações ao adotar o sistema de ensino.
FONTE: Estado de Minas