Césio 137 furtado em Minas: existe risco de acidente similar a Goiânia?
Quase 36 anos depois do acidente radiológico em Goiânia (GO), o furto de duas cápsulas com Césio 137 de uma mineradora em Nazareno, na Região Centro-Oeste de Minas Gerais, gera preocupação pelo risco de uma repetição do desastre. O uso do equipamento de forma inadequada traz sérios riscos à saúde e, por isso, a urgência em recuperar o material.
O sumiço do item foi comunicado na quinta-feira passada (29/6) à Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen), que conduz investigação interna do caso. De acordo com a Cnen, as fontes furtadas são classificadas como baixo risco, na casa dos 5 mCi (milicurie, medida de radioatividade), atividade quase 300 mil vezes menor que a do acidente de Goiânia.
Quanto maior o valor em mCi, maior será a intensidade da radiação emitida pela substância, o que implica em um nível mais elevado de radioatividade. O material, usado pela mineradora em medidores de densidade de polpa, estava selado e é blindado externamente em aço inoxidável, o que, segundo especialistas, torna o material seguro de ser carregado, evitando o rompimento da própria cápsula.
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Para a professora e pesquisadora Elisabeth Yoshimura, do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (Usp), ainda que a cápsula seja violada, o risco não chega à dimensão do desastre de Goiânia. "Não tem como. A atividade dessa fonte é muito baixa se comparada, por exemplo, com uma fonte de radioterapia, material que causou o acidente na cidade goiana", avalia.Mesmo contido dentro da cápsula, no entanto, o Césio traz riscos para a pessoa que estiver em contato com o material, afinal, quem trabalha com esses elementos, utiliza equipamentos e roupas especiais. A exposição equivale a quase 500 vezes mais do que a radiação natural, em uma distância de apenas um metro e meio. "Mesmo sem violar a cápsula, se deixou ela inteira e colocou no bolso, a pessoa já está se expondo à radiação gama. Quanto mais próxima, maior a quantidade de radiação", alerta a especialista.
O caso, na avaliação da especialista, é um retrato da falta de conhecimento da população sobre os riscos da manipulação de materiais radioativos. "Já fizemos uma pesquisa em escolas, e a maioria não reconhece o símbolo de perigo radioativo. O mais comum é dizer que o desenho é um ventilador", relata. Ela acredita que o furto foi motivado pela estrutura de metal, onde o Césio 137 é armazenado, e não pela substância. "Desconheço que tenha mercado para venda de Césio", disse.
Acidente em Goiânia
Considerado o maior acidente radioativo fora de uma usina nuclear, o caso de Goiânia terminou com a morte de quatro pessoas e outras centenas atingidas indiretamente. O desastre ganhou repercussão internacional. O acidente começou com a violação de uma máquina de radioterapia, encontrada em um terreno abandonado onde funcionava o Instituto Goiano de Radioterapia, na capital de Goiás.
Sem saber do que se tratava, o dono de um ferro-velho desmontou o aparelho para reaproveitar o chumbo, material bastante comercializável. Nesse momento, 19 gramas de cloreto Césio-137 ficaram expostos ao ambiente.
A aparência do composto, que emitia uma luz azulada, chamou atenção dos moradores e foi exibida durante quatro dias. Algumas pessoas chegaram, inclusive, a amostras do material radioativo para a casa.
Com essa dispersão, não demorou muito para as pessoas apresentarem os primeiros sintomas por ficaram expostas aos altos níveis de radiação.
As primeiras mortes aconteceram na família do dono do ferro velho. A mulher dele, Maria Gabriela, faleceu no dia 23 de outubro de 1987 e a sobrinha, Leide das Neves Ferreira, de 6 anos, morreu horas depois da tia. A garotinha foi a vítima que apresentou maior quantidade de radiação, pois ingeriu pequenas porções de Césio depois de brincar com o material radioativo.
* Estagiário sob supervisão do subeditor Thiago Prata
FONTE: Estado de Minas