Parte da história do beato Padre Eustáquio (1890-1943), reverenciado hoje nas cerimônias que lembram os 80 anos do seu falecimento, está à disposição de belo-horizontinos e visitantes no museu inaugurado, na manhã desta quarta-feira (30/08), no complexo do Santuário Arquidiocesano da Saúde e da Paz, mais conhecido como Igreja Padre Eustáquio, na Região Noroeste da capital. Estão à mostra no Centro Cultural/Ação Social Padre Eustáquio roupas e objetos usados pelo religioso holandês em processo de canonização, além de fotos e vídeos da cerimônia de beatificação, em 15 de junho de 2006.
Misto de teatro e museu, o espaço ao lado do templo foi visitado domingo por 12 parentes de Padre Eustáquio que vieram da Holanda especialmente para as homenagens ao beato. O prefeito Fuad Noman, nascido e criado no Bairro Padre Eustáquio, deve estar presente à abertura oficial, marcada para as 8h30. Ao longo do dia, haverá programação intensa no santuário, com missas às 6h, 7h, 9h, 11h, 13h, 15h e 17h. Às 19h, a celebração será solene, seguida de procissão luminosa. O Dia de Padre Eustáquio contará ainda com a participação do postulador da causa de canonização, o padre polonês Andrezej Lukawski, da Congregação dos Sagrados Corações, a mesma à qual pertenceu o beato.
À frente das homenagens ao líder religioso, cujos restos mortais repousam no memorial do templo, está o reitor do santuário, padre Vinícius Maciel, vice-postulador da causa de canonização e mestrando em ciência da religião na PUC Minas. Em entrevista ao EM, ele fala sobre o andamento do processo de canonização de Padre Eustáquio, o crescimento da devoção no beato e da espera pelo reconhecimento de um milagre para que Padre Eustáquio se torne santo e ganhe amplitude mundial entre cristãos.
Entrevista/Padre Vinícius Maciel, vice-postulador da causa de canonização do Beato Padre Eustáquio
“Uma mensagem de paz e saúde”
Qual o legado de Padre Eustáquio para o mundo, que acabou de sair de uma pandemia e assiste à guerra na Ucrânia?
A força do testemunho do Padre Eustáquio é justamente sua fidelidade a Jesus Cristo, e seu lema, Saúde e Paz, a forma de ler e de comunicar o Evangelho de Jesus Cristo: o Evangelho da Saúde e da Paz. Padre Eustáquio traz para nós a mensagem da paz, a mensagem da saúde em sentido bem amplo. Assim, seguir seu exemplo é, para nós, também ser mulheres e homens de paz, de reconciliação, de amor e de justiça.
Especificamente para o Brasil, onde o Beato Padre Eustáquio morou por 17 anos, quais os ensinamentos mais importantes?
Padre Eustáquio teve, nessa perspectiva que acabo de descrever, atenção e atitude totalmente voltadas para as pessoas, os sofredores, os doentes, os pobres. Isso, inclusive em sentido amplo, para aqueles que careciam de saúde física, do pão material, da casa para morar, de saúde e paz. Padre Eustáquio foi acolhedor, cuidadoso com as pessoas que necessitavam também da paz do coração, da conversão para conhecer Jesus e mudar seu caminho de vida.
Há fatos notáveis sobre a presença do Padre Eustáquio, como a conversão do presidente da República (de 1919 a 1922), Epitácio Pessoa (1865-1942), ou do jeito simples e humilde com que ele atendia cada criança à porta de sua casa paroquial. É um homem da humildade, da simplicidade, da escuta dos costumes e das práticas populares ligadas à saúde. Cultivou ervas medicinais e atendeu pessoalmente a quantas pessoas o procuraram.
Como está o processo de canonização do Padre Eustáquio na Santa Sé?
Em fase final. Toda a parte histórica, documental, já foi feita, e agora estamos pedindo a Deus que, pela intercessão do Padre Eustáquio, seja concedida a graça de um milagre, o que finalizaria o processo para ele ser declarado santo.
O senhor poderia adiantar se há registro de algum milagre?
Não que eu não possa adiantar, mas há casos que estão em estudo. Então, nós precisamos ter algum dado mais concreto para que possa ser apresentado à comunidade.
Padre Eustáquio viveu em São Paulo e Minas Gerais, com destaque para Romaria (antiga Água Suja) e Patrocínio, na Região do Alto Paranaíba, e Belo Horizonte. A devoção ao beato é algo restrito a esse passado ou avança por novas gerações?
É muito impressionante isto: como a juventude e as crianças não só recebem dos pais e dos avós essa tradição, como há o encontro com a vida do Padre Eustáquio, com a sua história, com o seu testemunho... Isso tem motivado muitos jovens no seguimento de Jesus Cristo.
Em outros estados brasileiros há devoção ao Padre Eustáquio em comunidades de fé?
Sim, nós temos paróquia, por exemplo, no Espírito Santo. Há também comunidades em outros estados, como nas regiões Nordeste e Centro-Oeste, onde temos cada vez mais, em várias cidades, as missas do dia 30 de agosto.
O que vai mudar com a possível canonização do Padre Eustáquio? O senhor está confiante no término do processo nos próximos anos?
Bom, esse é sempre nosso sonho, nosso desejo, que quando Deus julgar oportuno, realize o que é necessário para a canonização. O que muda é que, pelo fato de ser declarado santo, o culto se torna para todo o mundo, para toda a Igreja, então isso vai favorecer que o Evangelho da Saúde e da Paz seja conhecido por mais pessoas.
O senhor fez recentemente uma viagem com peregrinos brasileiros à cidade holandesa onde Padre Eustáquio nasceu. Há a expectativa entre a comunidade católica holandesa de ter um conterrâneo santo?
Entre a comunidade católica da região onde Padre Eustáquio nasceu, sim. Inclusive, nos últimos anos, a junção de várias paróquias da região formou uma nova paróquia com o nome do Beato Padre Eustáquio. Então, a gente percebe que há esse desejo. Na Holanda, a situação religiosa e social é muito diferente da que temos aqui, no Brasil, mas existe um grupo de pessoas muito interessadas, tanto que estamos recebendo 12 holandeses para as celebrações em torno dos 80 anos da Morte de Padre Eustáquio.
No Brasil, Padre Eustáquio passou momentos difíceis, sendo obrigado até mesmo a se esconder em uma propriedade particular, no estado de São Paulo. Por que ele causou tanta comoção pública? A fama de “milagreiro” incomodou seus superiores na Igreja Católica?
O fato de Padre Eustáquio ter se refugiado em Rio Claro (SP) é algo que mostra o grande afluxo de pessoas atrás dele. A gente precisa compreender que o Padre Eustáquio levava para os lugares onde estava uma enorme multidão de pessoas, e isso provocava não apenas um problema religioso, mas um problema de saúde pública, por que não havia água, instalações sanitárias e comida para a quantidade de pessoas que queria a bênção dele. Por esse motivo, teve que ser feito um controle e até a retirada dele de lugares de grande afluxo, por que não havia como controlar tudo isso.
O senhor, que vem estudando há anos a vida e a obra do Padre Eustáquio, o considera santo? Por quê?
Eu acredito que Padre Eustáquio reúne exatamente aquelas prerrogativas que a Igreja Católica prevê para proclamar como santa uma pessoa. E creio nisso com firme convicção, por que o Padre Eustáquio é um homem que viveu profundamente sua fé, um homem que viveu as virtudes cristãs de forma exemplar, um homem que, pela sua pregação, pelo seu testemunho, mais do que pelas graças que alcançava por meio do dom de cura, levou muitas pessoas para Jesus. Ele ajudou muitas pessoas na reconciliação com Deus e no retorno para a fé católica em nossa querida Igreja.
Memória
Jornada de fé
Em abril, um grupo de 26 peregrinos mineiros, de Belo Horizonte e Patrocínio, no Alto Paranaíba, cumpriu uma jornada orientada pela fé. Tendo como guia o reitor do Santuário Arquidiocesano da Saúde e da Paz, em BH, padre Vinícius Maciel, vice-postulador da causa de canonização de Padre Eustáquio, homens e mulheres estiveram na terra natal do beato, Aarle-Rixtel (foto), no Sul da Holanda. O roteiro contemplou ainda a Bélgica: as cidades de Tremelo, onde nasceu São Damião de Molokai (1840-1889), que cuidou de doentes desprovidos de assistência material e espiritual, e foi o missionário inspirador de Padre Eustáquio, e Lovaina, onde o belga foi sepultado. Em Tremelo, Padre Eustáquio fez seu noviciado. Em Paris, França, na Igreja Saint-Sulpice, o grupo assistiu à beatificação de cinco mártires, quatro da Congregação dos Sagrados Corações e um da Congregação dos Religiosos de São Vicente de Paulo. Eles foram fuzilados em 26 de maio de 1871, durante o sangrento desfecho da Comuna de Paris.