Zenyk, o coveiro ucraniano que ‘traz os heróis para casa’

18 out 2023
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Diariamente, Zenyk e seu cão, Nyk, percorrem o caminho de Donbass, na frente leste, até Dnipro para retirar os corpos dos soldados ucranianos mortos em combate.

Em um pequeno caminhão frigorífico branco com o logotipo das "Forças Armadas Ucranianas", Zenyk, um recruta de 51 anos que preferiu não dar seu sobrenome, vai, ao amanhecer, coletar os corpos de um necrotério militar na região oriental de Donetsk.

Trata-se de uma pequena casa discreta, sem sinalização visível, isolada à beira da estrada e com um antigo galpão fechado e refrigerado. As sacolas plásticas brancas e pretas que contêm os corpos estão colocadas no chão de cimento.

Zenyk descreve seu trabalho como "atípico", mas que "precisa ser feito".

"Você tem que levar os heróis para casa, os mortos. Eles também precisam voltar para casa, onde suas esposas, filhos e pais aguardam por eles", explica à AFP esse ex-empreiteiro de obras.

Em 2014, ele se ofereceu como voluntário para devolver às famílias os corpos de soldados mortos em confrontos com separatistas pró-russos, orquestrados pela Rússia.

Depois da ofensiva em fevereiro de 2022, Zenyk foi recrutado pelo Exército.

"O mais difícil era entregar o corpo aos familiares. Agora, não entro em contato com as famílias", diz esse pai de dois filhos. Um deles está em combate na região de Donetsky, e o outro é guarda de fronteira.

- Sem lágrimas -

Os sacos de óbitos são levados para o necrotério por unidades dedicadas à coleta de corpos na região, ou pelas brigadas a que os soldados pertenciam.

Zenyk disse estar "acostumado" com seu trabalho, porque "se você ficar lá chorando por cada um, é difícil suportar".

"Você chega e encontra 10, 15 corpos. Você sabe que deve fotografar (os rostos), verificar (as roupas) em busca de granadas, ou munições, descrever os corpos e, então, os rapazes colocam no veículo, uma vez cumpridos os trâmites administrativos", detalha.

Durante aquela manhã, ele carregou cerca de 20 corpos e os levou para o depósito de Dnipro, constatou à AFP.

Nem Kiev nem Moscou informam suas perdas. Segundo analistas, porém, o número de soldados feridos e mortos de ambos os lados, desde 24 de fevereiro de 2022, chega a dezenas de milhares - no mínimo.

Em uma rara declaração sobre o assunto, o presidente ucraniano, Volodimir Zelensky, disse a um veículo de comunicação americano em junho de 2022 que entre 60 e 100 soldados ucranianos morrem diariamente em combate.

"No início da invasão, havia muitos mortos, agora são menos", de acordo com Zenyk. "Em caso de ofensiva, chegam mais corpos, porque as ofensivas causam ainda mais vítimas", explica.

Segundo o coveiro, no início do conflito "não havia jovens, mas agora até os mais novos começaram a morrer, garotos nascidos em 2003, 2004".

Às vezes, ele também transporta soldados russos que se entregam ao Estado-Maior das Forças Armadas para serem trocados pelos corpos de soldados ucranianos.

No final daquela manhã, Zenyk pegou o volante de seu pequeno caminhão e partiu para Dnipro, a 200 km de distância. Acomodado no banco de passageiro ao seu lado está o cão Nyk, seu parceiro de um ano resgatado em Bakhmut, uma cidade arrasada por dois meses de combates.


FONTE: Estado de Minas


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