Filme ‘Black Rio!! Black Power!!’ emana poder ao relatar como o orgulho negro se disseminou nos bailes e incomodou o sistema
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Atração da 25ª edição do Festival do Rio, documentário de Emílio Domingos dá voz a nomes como Dom Filó para contar história do movimento negro carioca da década de 1970. Dom Filó é o entrevistado que conduz a narrativa do filme 'Black Rio!! Black Power!!', documentário de Emílio Domingos
Divulgação Cartaz do filme 'Black Rio!! Black Power!!', de Emílio Domingos Divulgação Resenha de documentário musical Título: Black Rio!! Black Power!! Direção e roteiro: Emílio Domingos Produção: Letícia Monte e Lula Buarque de Holanda Cotação: ★ ★ ★ ★ ★ ♪ Atração da 25ª edição do Festival do Rio, onde estreou na noite de ontem, 11 de outubro, dentro da mostra Première Brasil, o documentário Black Rio!! Black power!! é um filme mais sobre política do que música – e nesse foco social reside a força maior do longa-metragem dirigido e roteirizado por Emílio Domingos. Centrado em figuras determinantes para a criação e ascensão do Movimento Black Rio na cidade do Rio de Janeiro (RJ), entre 1972 e 1977, caso de Dom Filó, o documentário expõe fotos da época para que o espectador visualize a estética dos bailes da pesada organizados por equipes como a pioneira Soul Gran Prix. Contudo, a matéria-prima do roteiro são os depoimentos de nomes como o citado Dom Filó, Carlos Alberto Medeiros, Carlos Dafé, Marquinhos de Oswaldo Cruz e Virgilane Dutra. Personagens de história real, os entrevistados rememoram, de forma às vezes até didática, como se formou a consciência negra dos jovens do subúrbio carioca dos anos 1970 naqueles bailes, pontos de resistência, de acolhimento e da exposição de orgulho negro, simbolizado pelo cabelo black power. Nesse sentido, Black Rio!! Black Power!! é o irmão carioca do recente Chic Show (2023), filme do mesmo diretor Emílio Domingos, mas em parceria com Felipe Giuntini. Se o foco do documentário Chic Show é o orgulho despertado nos jovens negros paulistanos pelo bailes da equipe que dá nome ao filme, Black Rio!! Black Power!! mostra como os bailes da Soul Grand Prix deram voz e identidade ao jovem negro carioca a partir da disseminação do soul, do funk e da ideologia do cantor norte-americano James Brown (1933 – 2006), referência para toda a juventude planetária. O roteiro parte do Grêmio Social Esportivo Rocha Miranda – clube do subúrbio carioca caracterizado pelos entrevistas como o “templo do soul” – e desemboca no mesmo lugar após ter exposto a construção e o legado desse orgulho negro que assustou e incomodou o sistema, incluindo a polícia, a mídia e o governo repressor do Brasil. Imagem promocional do filme 'Black Rio!! Black Power!!', exibido na 25ª edição do Festival do Rio Divulgação Os relatos de racismo demolem o insustentável mito da democracia racial brasileira. Se os jovens levavam duras cotidianas da polícia quando estavam fora do ambiente protegido dos bailes, queixa reiterada por vários entrevistados, a expansão do movimento fez com que a mídia cobrasse dos jovens negros um nacionalismo risível. Impressiona a reprodução no filme de trechos de reportagens que questionavam os jovens por não estarem dançando e ouvindo samba – e comendo feijoada, símbolo brasileiro da culinária carioca. Com tal comportamento, a mídia da época forjou rivalidade inexistente entre o samba e a cultura soul / funk dos bailes. Até porque futuros bambas, como Arlindo Cruz, frequentavam o baile, como lembra Dom Filó. Tão ou mais nocivo é o relatório do Departamento de Ordem Política e Social – o temido Dops, um dos piores agentes da repressão da época – que alertou o governo sobre imaginadas segundas intenções dos organizadores e do público dos bailes. O filme acerta ao expor o relatório do Dops – lido por Dom Filó – para explicitar que nenhum exagero há nas falas dos entrevistados, unânimes em apontar a perseguição do status quo aos jovens negros. Esse sistema conseguiria esvaziar os bailes – sem jamais ter conseguido anular a força do pensamento negro – com a propagação da disco music a partir de 1978, ano em que Filó sai do Movimento Black Rio, que já havia gerado em 1977 a banda Black Rio. Os bailes perderam público para as discotecas, mas permaneceu o legado, absorvido a partir da década de 1980 pela geração do hip hop brasileiro, como ressalta Filó. O movimento acabou quando as cabeças já estavam feitas. Permaneceram o pensamento – como resume Dom Filó em fala lapidar ao fim do documentário – e o orgulho negro, já disseminado na historicamente racista sociedade brasileira. Simples na estrutura e poderoso na mensagem, Black Rio!! Black Power!! é filme político que merece ser visto.FONTE: G1 Globo